Teoria sóciointeracionista
A maior preocupação de Lev Semynovitch Vygotsky, pesquisador contemporâneo de Piaget, foi entender a influência da linguagem ou da comunicação no desenvolvimento cognitivo do indivíduo tendo em vista o contexto histórico no qual vivia a Revolução Socialista.
A teoria sóciointeracionista entende que o conhecimento emerge da relação sujeito- sociedade- objeto. Portanto é uma relação mediada por processos histórico-culturais. Pelo esquema, percebe-se que antes de tomar contato com o objeto do conhecimento, este já está configurado socialmente. Manacorda define bem esse primado social.
O primado do social é para Vygotsky incontestável: “o primum não é uma inexistência e impensável criança isolada, mas sempre e somente criança que cresce no seio da sociedade humana”. ( Manacorda 1995, p.326 )
Reafirmando a importância do meio sócio-histórico na formação da criança, Vygotsky afirmou que as funções mentais superiores são internalizadas a partir de dois níveis: o inter-psicológico e o intra-psicológico. O primeiro tem a ver com as práticas humanas inerentes ao contexto cultural da criança, sendo, portanto, produzidas coletivamente. Então é a partir dessa interação sujeito – grupo - social, mediada por membros mais experientes, que a criança particulariza o uso específico das funções superiores, sendo este um momento individual. O próprio Vygotsky esclarece essa relação inter e intra-psicológica: Segundo Manacorda Citado por Oliveira (1995. p.326) “Inicialmente outras pessoas agem sobre a criança, depois ela mesma entra em relação de interação com aqueles que circundam, em seguida começa por sua vez agir sobre os outros e, no fim e somente no fim, começa a agir sobre si mesma”.
Essa ênfase que Vygotsky e seus colaboradores (Luria e Leontiev entre outros) dão ao aspecto social provém da matriz teórica adotada por eles, que é o materialismo histórico dialético, de Marx e Engels. Decorre daí a importação de diversos termos do marxismo para a psicologia soviética, tais como: apropriação, produção, base material e outros.
Mesmo algumas hipóteses levantadas, Vygotsky já haviam sido formuladas por Marx, como se vê nesta passagem de A Ideologia Alemã: Não é a consciência que determina a vida, é a vida que determina a consciência... parte-se dos próprios indivíduos reais e considera-se a consciência apenas como sua consciência. ( Vygotsky 1984, p.20 ).
Semelhante a Marx, Vygotsky diria que “A internalização das atividades socialmente enraizadas e historicamente desenvolvidas, constitui o aspecto característico da psicologia humana” ( Vygotsky 1991, p.65 ).
Inclusive, em uma de suas conferências, Vygotsky afirmou que não queria construir uma psicologia com retalhos de Marx, mas superar o que chamou de “crise da psicologia” a partir do método dialético utilizado por ele em “O capital”.
A crise a que ele se referia era a divisão entre a corrente psicológica subjetiva (racionalista), de Chelpanov e a reflexologia (empirista) de Ivan Pavlov. E para superar essa divisão Vygotsky propôs a criação do método dialético, que faria a grande síntese entre o subjetivismo e o materialismo histórico, ou seja atribuir ao surgimento da consciência uma base material.
São vários termos pelos quais a psicologia soviética tem sido conhecida: sociointeracionalismo, histórico-cultural ou sócio-histórica. Na sua época, Vygotsky utilizou três termos para conceituá-la: psicologia cultural, histórica e instrumental (Luria, 1988, p. 26). Cada um desses termos estava ligado a uma de suas dimensões. Os aspectos culturais e históricos. O aspecto instrumental se refere às mediações que o sujeito usa para atuar sobre a realidade.
Vygotsky em sua obra destaca a concepção multidimencional como encara a criança. Para ele, as funções psicológicas superiores estão interligados uma interagindo com a outra na medida em que a criança vai se apropriando dos instrumentos culturais disponíveis. A forma de conhecer o mundo se dá por apropriação, ou seja, no aspecto instrumental (tecnologia) ou conceitual (crenças, valores, conhecimentos). Todavia, essa abordagem não pode ser confundida com o ambientalismo, pois a apropriação não significa cópia real, mas sim um processo de reelaboração individual daquilo que foi historicamente produzido pela humanidade, já que o sujeito é concebido como um ser ativo na relação com o meio cultural. Advém daí a importância que Vygotsky ao papel da linguagem no desenvolvimento humano, pois é através dela que compartilhamos o significado dos símbolos socialmente convencionados que conceituam o mundo. Assim, a apropriação de conceitos é uma atividade complexa pois coloca em movimento as múltiplas funções superiores. A esse respeito La Taille,(1993. pág 184) esclarece:
Das investigações do processo de formação dos conceitos, é sabido que o conceito não é simplesmente um conjunto de conexões associativas que se assimila com a ajuda da memória, não é um hábito mental automático, mais sim um autêntico e complexo ato do pensamento. (...) O processo de desenvolvimento dos conceitos ou dos significados das palavras exige o desenvolvimento de uma série de funções (a atenção voluntária, a memória lógica, a abstração, a comparação e a diferenciação ) de modo que uns processos psíquicos tão complexos não podem ser aprendidos de modo simples.
A explicação acima reporta também à importância do processo de escolarização, pois na abordagem sócio histórica os conceitos são divididos em “espontâneos” e “científicos”. Os primeiros são noções comuns, apropriadas pelas crianças nas relações imediatas com as pessoas. Já os científicos, carecem de maior sistematização, entrando em cena a escola como mediadora fundamental na evolução do nível conceitual da criança. É importante salientar que não podem ser desprezados os conceitos espontâneos pois são as bases para a evolução posterior do pensamento infantil.
Ainda sobre a formação de conceitos Oliveira citado por La Taille assim escreve:
A criança adquire consciência dos seus conceitos espontâneos relativamente tarde: a capacidade de defini-los por meio de palavras, de operar com eles a vontade, aparecer muito tempo depois de ter adquirido os conceitos. Ela possui o conceito isto é conhece o objeto ao qual o conceito se refere, mas não está consciente do seu próprio pensamento. O desenvolvimento de um conceito cientifico, por outro lado, geralmente começa com sua definição verbal e com sua aplicação em operações não-espontâneas ao se operar se operar com p próprio conceito, cuja existência na mente da criança tem inicio a um nível que só posteriormente será atingido pelos conceitos espontâneos. (La Taille. 1992 p. 31 )
Piaget e seus colaboradores desenvolveram pesquisas importantes sobre o PAPEL FUNDAMENTAL DA LINGUAGEM NA SISTEMATIZAÇÃO DAS EXPERIÊNCIA DA CRIANÇA, pois serve para orientar o seu comportamento social.
Sendo assim ao longo do desenvolvimento cognitivo, a relação entre a fala e a ação se modifica, ocorrendo em três fases:
Na fase da fala social (até os três anos ), a fala acompanha as ações da criança de forma dispersa e caótica, refletindo as dificuldades que ela sente para solucionar as questões que lhe são colocadas.
Na fase da fala egocêntrica ( três aos seis ), a fala passa a preceder a ação mudando a sua função. Agora ela passa a atuar como auxiliar do plano de ação já concebido, mas ainda não realizado.
Na fase da fala interior ( após os seis anos ), a fala externa da criança vai desaparecendo até se tornar interna. A internalização progressiva da fala permite que a criança adquira a função de auto regulação ou função planejadora, sendo, a partir daí, capaz de controlar seu comportamento, seu pensamento, percepção, atenção, memória e capacidade de solucionar problemas, mesmo quando estes não estão no seu capo visual.
O aspecto da fala é considerada essencial no processo de aprendizagem pois estimula vários processos internos de desenvolvimentos que não são avaliados pelo professor.
Neste sentido o professor poderá avaliar as funções que estão em maturação e que não foram percebidas, podendo assim estimular a criança a se desenvolver ainda mais.
Com base nesses pressupostos, Vygotsky desenvolveu o conceito de zona de desenvolvimento proximal, que é entendida como distância entre o desenvolvimento real d criança e o seu desenvolvimento potencial. O primeiro é caracterizado pela solução independente de problemas, e o segundo pela solução de problemas sob orientação ou colaboração de um adulto ou colega.
Assim, a zona de desenvolvimento proximal permite ao professor o que a criança é capaz de atingir, bem como definir seu estado de desenvolvimento cognitivo. Nessa perspectiva, o professor não deve enfocar aquilo que a criança já aprendeu, mais o que ela realmente necessita aprender para atingir seu desenvolvimento real.
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